Teses Defendidas

Da(s) Crise(s) à Adaptação: Famílias com filhos adultos emergentes em contexto de instabilidade macroeconómica

Gabriela Jorge Fonseca

Data de Defesa
22 de Outubro de 2021
Programa de Doutoramento
Doutoramento Interuniversitário em Psicologia Clínica, Psicologia da Família e Intervenção Familiar
Orientação
Ana Paula Relvas e Carla Crespo
Resumo
Introdução: O início do século XXI está a ser profundamente marcado por crises macroeconómicas. Ao longo dos últimos anos, as famílias portuguesas têm vivido num contexto macroeconómico instável na sequência da crise de 2008. Aproximadamente uma década depois, surge uma nova crise com contornos socioeconómicos complexos associada à pandemia de COVID-19. A emergência de circunstâncias macroeconómicas desfavoráveis acarreta desafios psicossociais para os indivíduos e famílias, incluindo declínios na saúde mental e no bem-estar familiar. Nos contextos macroeconómicos contemporâneos, são impostos reptos particularmente complexos às famílias com filhos adultos emergentes (i.e., 18-30 anos), na medida em que o ambiente de instabilidade pode ameaçar o processo de autonomização financeira dos jovens, tarefa desenvolvimental central deste período. Ancorada numa abordagem sistémica, atenta às interfaces entre dimensões contextuais e desenvolvimentais, e partindo de teorias de stress e resiliência familiares, esta investigação procurou desenvolver uma visão mais aprofundada sobre as vivências das famílias com filhos adultos emergentes em contexto de instabilidade macroeconómica. Foram definidos os seguintes objetivos principais: I. conhecer as exigências macroeconómicas que as famílias com filhos adultos emergentes têm enfrentado nos últimos anos e o seu impacto psicossocial; II. compreender como as mesmas se têm adaptado a estas exigências, identificando processos familiares de resiliência neste contexto de adversidade.

Metodologia: Esta investigação apresenta um desenho metodológico misto, compreendendo a recolha de dados quantitativos em 2016/2017, através de questionários de autorresposta; e de dados qualitativos em 2018/2019, através de entrevistas familiares conjuntas. Foi recolhida informação de múltiplos membros da família (pais, mães, e filho/as adulto/as emergentes), tendo participado um total de 424 famílias (1220 indivíduos) na componente quantitativa e de 14 famílias (48 indivíduos) na componente qualitativa. Na globalidade, esta investigação integra 11 estudos: seis estudos preliminares, quatro estudos conduzidos a partir dos dados quantitativos e um estudo conduzido a partir dos dados qualitativos. O trabalho preliminar envolveu duas revisões da literatura (Estudos 1 e 2), três estudos de adaptação de instrumentos que integraram o protocolo de investigação quantitativa (Estudos 3, 4 e 5); e um estudo adicional que, através de uma análise de dados omissos (missings), permitiu identificar boas práticas na avaliação de exigências macroeconómicas (Estudo 6). Adotando diferentes unidades de análise (individual, diádica, familiar), os Estudos 7, 8, 9, 10 e 11 procuraram responder aos objetivos principais do presente trabalho.

Resultados: A partir da análise e integração dos resultados dos diferentes estudos, concluiu-se que, na sequência da crise de 2008, as famílias portuguesas com filhos adultos emergentes enfrentaram permanentemente exigências macroeconómicas - de natureza objetiva, sob a forma de adversidade económica (e.g., perda de rendimentos), sobretudo no início da década passada; e subjetiva, sob a forma de preocupações e receios financeiros (e.g., conseguiremos manter/encontrar emprego?), principalmente no final da década passada - as quais se traduziram num conjunto de custos psicossociais para os membros da família e para a família como um todo. Enquanto o impacto de exigências macroeconómicas objetivas se revelou mais pronunciado para certos grupos (e.g., subsistema parental, famílias de nível socioeconómico mais baixo), as implicações das preocupações financeiras foram transversais para indivíduos e famílias. Identificaram-se três grupos de processos familiares facilitadores da adaptação a exigências macroeconómicas: modus operandi e reajustamentos financeiros, recursos familiares, e significados e crenças familiares. O suporte parental destacou-se como um dos recursos mais significativos para lidar com a incerteza em tempos macroeconómicos difíceis.

Conclusões: Não obstante as suas limitações (e.g., desenho transversal, foco nas famílias nucleares intactas), esta investigação contribuiu para o avanço do conhecimento científico sobre as interfaces entre famílias e os seus contextos macroeconómicos, proporcionando um primeiro retrato das vivências das famílias portuguesas com filhos adultos emergentes em instabilidade macroeconómica. Dos resultados deste trabalho decorrem implicações para a investigação futura, cuja pertinência se acentua atendendo à emergência da crise pandémica, bem como implicações práticas de carácter clínico e macrossocial. O mapeamento de custos económicos e psicossociais e de respostas adaptativas a exigências macroeconómicas, realizado nesta investigação, pode informar o desenvolvimento de programas e políticas públicas que visem a redução dos impactos negativos das crises macroeconómicas na vida de indivíduos, famílias e comunidades.

Palavras-chave: crise macroeconómica, adaptação familiar, famílias com filhos adultos emergentes, metodologia mista, investigação com famílias