Teses Defendidas
Justiça procura Perícia(s). Os processos de regulação das responsabilidades parentais.
24 de Julho de 2017
Direito, Justiça e Cidadania no Século XXI
Sílvia Portugal
No final do século XX início do século XXI, nas sociedades ocidentais, cruzam-se duas tendências. Por um lado, um aumento consistente dos conflitos judiciais em torno das crianças, fruto das transformações interligadas da família, das relações parentais e de género, da valorização crescente das crianças enquanto objeto afetivo da família e da regulação jurídica das relações parentais. Por outro lado, a adoção de critérios indeterminados e gender neutral, como o superior interesse das crianças, e a exigência de respostas individualizadas na regulação judicial do exercício das responsabilidades parentais leva a que na prática judiciária seja solicitado, cada vez com mais frequência, o contributo de profissionais não-judiciais. Não obstante Portugal acompanhe estas tendências, os estudos sociológicos sobre o contributo dos/as peritos/as nos processos judiciais são escassos e negligenciam a problemática dos processos tutelares cíveis de regulação das responsabilidades parentais. Revela-se, assim, fundamental refletir sobre a relação entre o direito e a justiça de família e das crianças e as perícias judiciárias, entre magistrados/as e peritos/as, na aplicação do direito da família e das crianças nos Tribunais portugueses, e o seu contributo para a (re)produção, direta ou indireta, de (des)igualdades de género. É este o objetivo a que me proponho nesta tese.
A pesquisa parte de duas hipóteses centrais. A primeira hipótese afirma a centralidade das perícias judiciárias nos processos judiciais de regulação do exercício das responsabilidades parentais, tanto na definição do regime de regulação das responsabilidades parentais, como na condução do processo judicial, num processo de colonização da prática judiciária pelas perícias judiciárias. A segunda hipótese afirma que, tanto as perícias, como as decisões judiciais são influenciadas por e (re)produzem conceções dominantes de maternidade, paternidade e família, (re)produzindo desigualdades sociais e sexuais. Consequentemente, a análise desenvolve-se em torno de quatro objetivos: 1. Averiguar que perícias são convocadas para formar a decisão judicial; 2. Analisar o contributo destas perícias para o processo e decisão judicial; 3. Analisar como as/os magistradas/os interpretam e utilizam (ou não) o contributo das perícias judiciárias nos processos e decisões judiciais em articulação (ou não) com a lei; 4. Averiguar como o discurso pericial e judicial (re)produz conceções dominantes em relação ao género e parentalidade na definição do regime de regulação das responsabilidades parentais.
Do ponto de vista metodológico, a prossecução destes objetivos implicou, em primeiro lugar, o recurso ao conceito de coprodução e à definição sociológica e abrangente de perícia, em vez da jurídica, como elementos estruturadores do modelo de análise. E, em segundo lugar, à análise documental, como principal técnica de recolha da informação, e às entrevistas, como técnica complementar. Tomou-se como objeto empírico os processos tutelares cíveis relativos à regulação do exercício das responsabilidades parentais findos, em 2014, numa secção especializada de família e menores, com decisão judicial ou homologação de acordo.
A análise desenvolvida permitiu, de um modo geral, confirmar as hipóteses estabelecidas. Em primeiro lugar, a análise revela a amplitude e heterogeneidade do impacto das perícias judiciárias nos processos de regulação do regime de responsabilidades parentais, que se estende a montante da decisão judicial, aos diferentes atos processuais e decisões judiciais. Em segundo lugar, a análise do discurso pericial e judicial sobre homens e mulheres quanto às competências parentais, mostra expectativas distintas em relação a cada um dos sexos, assentes em conceções dominantes de paternidade e maternidade, com consequências diretas na definição do regime de regulação das responsabilidades parentais. Esta pesquisa pretende ser um contributo para o debate sociológico sobre o impacto das perícias judiciárias na regulação judicial do exercício das responsabilidades parentais, e abrir novas pistas de análise para a discussão sobre o papel do direito e das perícias, dos/as profissionais da magistratura e peritos/as, no regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais português.
Palavras-chave: Regulação das Responsabilidades Parentais; Decisões Judiciais; Perícias judiciárias; Maternidade; Paternidade
Data de Defesa
Programa de Doutoramento
Orientação
Resumo
A pesquisa parte de duas hipóteses centrais. A primeira hipótese afirma a centralidade das perícias judiciárias nos processos judiciais de regulação do exercício das responsabilidades parentais, tanto na definição do regime de regulação das responsabilidades parentais, como na condução do processo judicial, num processo de colonização da prática judiciária pelas perícias judiciárias. A segunda hipótese afirma que, tanto as perícias, como as decisões judiciais são influenciadas por e (re)produzem conceções dominantes de maternidade, paternidade e família, (re)produzindo desigualdades sociais e sexuais. Consequentemente, a análise desenvolve-se em torno de quatro objetivos: 1. Averiguar que perícias são convocadas para formar a decisão judicial; 2. Analisar o contributo destas perícias para o processo e decisão judicial; 3. Analisar como as/os magistradas/os interpretam e utilizam (ou não) o contributo das perícias judiciárias nos processos e decisões judiciais em articulação (ou não) com a lei; 4. Averiguar como o discurso pericial e judicial (re)produz conceções dominantes em relação ao género e parentalidade na definição do regime de regulação das responsabilidades parentais.
Do ponto de vista metodológico, a prossecução destes objetivos implicou, em primeiro lugar, o recurso ao conceito de coprodução e à definição sociológica e abrangente de perícia, em vez da jurídica, como elementos estruturadores do modelo de análise. E, em segundo lugar, à análise documental, como principal técnica de recolha da informação, e às entrevistas, como técnica complementar. Tomou-se como objeto empírico os processos tutelares cíveis relativos à regulação do exercício das responsabilidades parentais findos, em 2014, numa secção especializada de família e menores, com decisão judicial ou homologação de acordo.
A análise desenvolvida permitiu, de um modo geral, confirmar as hipóteses estabelecidas. Em primeiro lugar, a análise revela a amplitude e heterogeneidade do impacto das perícias judiciárias nos processos de regulação do regime de responsabilidades parentais, que se estende a montante da decisão judicial, aos diferentes atos processuais e decisões judiciais. Em segundo lugar, a análise do discurso pericial e judicial sobre homens e mulheres quanto às competências parentais, mostra expectativas distintas em relação a cada um dos sexos, assentes em conceções dominantes de paternidade e maternidade, com consequências diretas na definição do regime de regulação das responsabilidades parentais. Esta pesquisa pretende ser um contributo para o debate sociológico sobre o impacto das perícias judiciárias na regulação judicial do exercício das responsabilidades parentais, e abrir novas pistas de análise para a discussão sobre o papel do direito e das perícias, dos/as profissionais da magistratura e peritos/as, no regime de regulação do exercício das responsabilidades parentais português.
Palavras-chave: Regulação das Responsabilidades Parentais; Decisões Judiciais; Perícias judiciárias; Maternidade; Paternidade