Heranças coloniais em tempos de 'Black Lives Matter'

Estudos CES

Violência colonial e testemunho: Para uma memória pós-abissal

Bruno Sena Martins

Revista Crítica de Ciências Sociais

Apresentação

No espaço da democracia portuguesa, existe uma improvável “semelhança de família” entre a agenda antirracista e o quadro reivindicativo que deu corpo à Associação dos Deficientes das Forças Armadas. Essa semelhança reside tão-só na centralidade de se reconhecer a violência colonial enquanto um elemento estruturante da história e da sociedade portuguesa. Nessa denegada centralidade, importa considerar como a Guerra Colonial / Lutas de Libertação (1961-1974) constituem elementos constitutivos da reconstrução democrática e pós-imperial da sociedade portuguesa. Partindo de uma extensa recolha de histórias de vida de “deficientes das Forças Armadas”, o presente texto procura analisar as lutas pelo sentido trazidas pelas suas narrativas. Por um lado, procuramos perceber os termos de um confronto entre uma memória da violência, corporalmente inscrita, e a tentada elisão da violência colonial no senso comum do Portugal democrático. Por outro, procuramos compreender de que modo a noção de uma guerra evitável e injusta, crescentemente sedimentada após o seu ocaso, cria um paradoxo para aqueles que, tendo sido parte de uma força agressora, se configuram como vítimas.

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Martins, Bruno Sena (2015), "Violência colonial e testemunho: Para uma memória pós-abissal", Revista Crítica de Ciências Sociais, 106, 105-126.