Seminário #9 | «Conversas Desconfinadas»
Que farei quando tudo arde? Diversidade e relações de cuidado em pessoas acima dos 60
Ana Cristina Santos (CES)
1 de setembro de 2020, 16h00 (GMT +01:00)
Evento em formato digital
Relatório do Seminário
Decorreu no dia 1 de setembro a 9ª sessão do ciclo de seminários “Conversas Desconfinadas”, organizado pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. A sessão marcou o retorno destes eventos semanais depois de um interregno durante o mês de agosto e teve como título Que farei quando tudo arde? Diversidade e relações de cuidado em pessoas acima dos 60.
A sessão iniciou-se com a apresentação de Ana Cristina Santos, investigadora do Centro de Estudos Sociais, tendo como base a sua investigação no projeto CILIA - LGBTQ: Comparing Intersectional Life Course Inequalities amongst LGBTQ Citizens in Four European Counties. Ana Cristina Santos começou por sublinhar que a pandemia não introduziu algo fundamentalmente novo no que concerne a desigualdades e exclusões, tendo agravado as já existentes. E este foi sobretudo o caso dos indivíduos LGBTQI+ com mais de 60 anos.
A investigadora traçou um paralelismo entre esta pandemia e os anos 80s, quando o VIH/SIDA motivou uma série de atitudes discriminatórias e hostis para com os homossexuais, exacerbando a sua estigmatização e o seu isolamento. Alguns dos inquiridos durante o contexto da investigação reportaram também algumas semelhanças, sobretudo no que concerne à linguagem utilizada (grupos de risco, contágio, contaminação, realizar o teste…) e às medidas de segurança (distanciamento físico ao invés da ausência de relações sexuais, as máscaras FP2 como substitutas dos preservativos, o medo difuso e generalizado, etc).
Estas pessoas viram-se assim expostas a um duplo confinamento, pois também sofreram um confinamento social, devido à perda ou enfraquecimento das redes de apoio e suporte, que para as pessoas LGBTQI+ assume um papel de extrema importância. Este duplo isolamento manifestou-se na maior vulnerabilidade deste grupo a ramificações mentais e psicológicas que os restantes grupos.
O primeiro comentário ficou a cargo de Cecília MacDowell Santos - Professora Catedrática do Departamento de Sociologia da Universidade de São Francisco (USF) e investigadora do CES - que sublinhou as diferenças entre as pessoas heterossexuais e as LGBTQI+, e porque razão essas diferenças colocam estas últimas em maior vulnerabilidade durante a pandemia. A investigadora abordou também a forma como a idade e a existência de determinadas doenças caraterizam os principais grupos de risco e como os discursos da pandemia levaram a que se criasse um clima de estigma e medo face a estas pessoas.
Cecília Santos focou-se depois no caso específico de Portugal enquanto país que registou enormes avanços legais em termos de proteção e reconhecimento das pessoas LGBTQI+, mas que ainda assim manifesta atitudes discriminatórias acima do que seria expectável, apontando para a discriminação auto-percecionada durante a investigação que Ana Cristina Santos apresentou. Um fator explicativo reside no facto de os inquiridos terem mais de 60 anos e não terem sido muito impactados pelas alterações legislativas, como o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a possibilidade de adoção de crianças por casais homossexuais.
Por fim, Cecília Santos destacou a importância das redes de cuidados e suporte para estas pessoas que se encontram isoladas e discriminadas, e a dificuldade acrescida em aceder às mesmas no contexto de quarentena e, mais recentemente, de distanciamento físico e social.
O último comentário foi de Susana de Noronha que se focou no impacto do COVID-19 na vida dos indivíduos, em particular idosos e LGBTQI+. Partilhou alguns casos de mulheres portadoras de cancro e como lidaram com a situação durante a pandemia, assim como de experiências próximas. A investigadora concluiu o comentário destacando a importância de enquanto cidadãos/ãs e investigadores/as questionarmos a normalização de práticas discriminatórias.