Theses defended
State Feminism in Portugal: mechanisms, strategies, policies and metamorphoses
July 11, 2011
Virgínia Ferreira
In nearly forty years of democracy, Portugal has eliminated sex discrimination from the law, committed itself to the international policies of equality, affirmative action and "gender mainstreaming", and created two equality mechanisms. We have what has been called a good law, which seems to demonstrate the will and action of the Portuguese State in the promotion of gender equality. However, ineffectiveness in the implementation of many policies has been a source of concern in this work, which crosses the fields of sociology of the state and political science, social movements and gender. In it I begin by questioning the role that the Portuguese government has played in the promotion of gender equality since 1970, specifically with the creation of the main equality mechanism (CSW/CEWR), currently the Commission for Citizenship and Gender Equality (CCGE). This Commission represents what has been regarded as a form of institutional feminism, a phenomenon studied by the state feminism approach. Therefore, it is the main object of this research.
I've used the state feminism approach which advocates the idea that at some point the State, previously seen by most of the feminist movement as a patriarchal rival, became an ally of the causes of women, including their interests in its political agendas. It is considered that the equality mechanisms have been allies of women's movements in the descriptive and substantive representation of women, their levels of success depending on factors mainly linked to the sociopolitical environment and the characteristics of women's movements.
I've adopted the concept of state feminism because it is a relational concept that captures the strategic inter-influence between women's movements, mechanisms such as the Commission and other State and political actors in the production of policy outcomes, including equality policies. The production of these policies is seen as complex and multidimensional, and not only dependent on the dominant action of major actors (State, political parties or social movements), although in certain contexts one or another of them might prevail.
The central goal of this study is to understand the role and work of the Commission as a pivot actor between women's movements and the state in demanding policies and legislation promoting gender equality. Such action reflects the concept of state feminism. I demonstrate that the role of this equality mechanism is constrained by factors proposed in the literature, such as structures of political opportunities and mobilizing structures.
The empirical research was carried out with a case study of the Commission, which required a qualitative approach that used as sources 53 semi-structured interviews and analysis of archival material, legislation, publications and press articles.
In terms of research outputs the analysis identified four categories of participation and results of state feminism around agendas or specific policy areas - insider, marginal, symbolic, absent (chapter 4); and also four phases in the evolution of state feminism - emerging, powered, formal and challenged (chapter 5). I concluded that the Commission has been, over the hears, in Portugal, a decisive carrier of feminist claims, with different impacts depending on factors related primarily to the sociopolitical context, to the characteristics of women's movements, but also depending on some of their own specific characteristics. She was a feminist core in the state, and an ally of the Portuguese women's movement, an alliance that has evolved over the more than 30 years, during which it has leveraged women's issues and gender equality policies albeit with limited success, what I have appointed as a gap between the real and the possible.
Nestes quase quarenta anos de democracia, Portugal eliminou da legislação a discriminação em razão do sexo, assumiu o compromisso internacional com a agenda da igualdade e com as políticas de acção positiva e de "mainstreaming de género", e criou dois mecanismos oficiais permanentes para a igualdade de mulheres e homens. Temos o que tem sido considerado como uma boa legislação que parece demonstrar a vontade e acção do Estado português na promoção da igualdade entre os sexos. Porém, a constatação de inefectividades múltiplas na implementação das políticas foi uma das inquietações na origem deste trabalho, que cruza os campos da sociologia do Estado e da ciência política, da sociologia dos movimentos sociais e das relações sociais de sexo. O Estado Português tem vindo a assumir políticas de promoção da igualdade de mulheres e homens desde 1970, concretamente com a criação do principal mecanismo oficial para a igualdade (CCF/CIDM), actualmente a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG). Esta Comissão corporiza, no nosso país, o que tem sido considerado como uma forma de feminismo institucional, fenómeno estudado internacionalmente pela abordagem do feminismo de Estado. Por isso, sobre ela incidiu a pesquisa aqui apresentada.
Como quadro de referência conceptual usei a abordagem do feminismo de Estado que traduz a ideia de que a determinada altura o Estado, anteriormente visto pela maioria dos movimentos feministas como um opositor e rival patriarcal, terá passado a ser ele mesmo um aliado das causas das mulheres, incluindo-as nas suas agendas políticas. Considera-se que os mecanismos oficiais para a igualdade têm sido aliados dos movimentos de mulheres na representação descritiva e substantiva das mulheres, variando os seus níveis de sucesso em função de factores essencialmente ligados ao ambiente sociopolítico e às características dos movimentos de mulheres.
Adoptei o conceito de feminismo de Estado por ele ser um conceito relacional que traduz a interinfluência estratégica entre movimentos de mulheres, mecanismos como a Comissão e restantes agentes estatais e políticos na produção de resultados políticos, nomeadamente de políticas de igualdade. A produção destas políticas é vista como um processo complexo, multidimensional não dependente apenas da acção dominante de um tipo de agente (Estado, partidos políticos ou movimentos sociais), ainda que em determinados contextos um ou outro possa prevalecer.
O objectivo central deste estudo dirigiu-se, portanto, ao questionamento do papel e da acção da Comissão, como articuladora e agente pivô entre os movimentos de mulheres e o Estado na promoção de reivindicações, políticas e legislação para a igualdade de mulheres e homens, traduzindo-se esta acção no conceito de feminismo de Estado. Neste estudo procuro demonstrar o papel do mecanismo oficial para a igualdade em função de factores propostos na literatura, como sejam os de estruturas de oportunidades políticas e as estruturas de mobilização.
A pesquisa empírica foi realizada com base num estudo de caso sobre a Comissão, que requereu uma abordagem qualitativa composta, em termos de fontes de investigação, pela realização de 53 entrevistas semi-estruturadas e pela análise de material de arquivo (actas e documentos diversos) de legislação, publicações e artigos de imprensa.
A análise permitiu identificar quatro tipos de categorias em termos de efectividade e resultados (insider, marginal, simbólico, ausente) do feminismo de Estado em torno de agendas ou áreas políticas específicas (capítulo 4); e ainda quatro fases na evolução do feminismo de Estado - emergente, potenciado, formal e desafiado (capítulo 5). Foi possível concluir que a Comissão foi ao longo dos anos, em Portugal, uma portadora decisiva das reivindicações feministas perante o Estado, com impactos diferenciados consoante factores e variáveis relativos essencialmente ao contexto sociopolítico de actuação, a características/estratégias dos movimentos de mulheres, mas também consoante características suas específicas que a capacitaram (ou não) a efectivar a sua missão de participação na produção de legislação e de políticas. Ela foi um núcleo feminista no Estado, foi uma aliada dos movimentos de mulheres portugueses, numa aliança que evoluiu ao longo dos mais de 30 anos analisados, e ao longo dos quais tem alavancado as questões das mulheres e das políticas de igualdade sexual em Portugal, ainda que com um sucesso bastante limitado e condicionado, no que designei de hiato entre o possível e o real.
Public Defence date
Supervision
Abstract
I've used the state feminism approach which advocates the idea that at some point the State, previously seen by most of the feminist movement as a patriarchal rival, became an ally of the causes of women, including their interests in its political agendas. It is considered that the equality mechanisms have been allies of women's movements in the descriptive and substantive representation of women, their levels of success depending on factors mainly linked to the sociopolitical environment and the characteristics of women's movements.
I've adopted the concept of state feminism because it is a relational concept that captures the strategic inter-influence between women's movements, mechanisms such as the Commission and other State and political actors in the production of policy outcomes, including equality policies. The production of these policies is seen as complex and multidimensional, and not only dependent on the dominant action of major actors (State, political parties or social movements), although in certain contexts one or another of them might prevail.
The central goal of this study is to understand the role and work of the Commission as a pivot actor between women's movements and the state in demanding policies and legislation promoting gender equality. Such action reflects the concept of state feminism. I demonstrate that the role of this equality mechanism is constrained by factors proposed in the literature, such as structures of political opportunities and mobilizing structures.
The empirical research was carried out with a case study of the Commission, which required a qualitative approach that used as sources 53 semi-structured interviews and analysis of archival material, legislation, publications and press articles.
In terms of research outputs the analysis identified four categories of participation and results of state feminism around agendas or specific policy areas - insider, marginal, symbolic, absent (chapter 4); and also four phases in the evolution of state feminism - emerging, powered, formal and challenged (chapter 5). I concluded that the Commission has been, over the hears, in Portugal, a decisive carrier of feminist claims, with different impacts depending on factors related primarily to the sociopolitical context, to the characteristics of women's movements, but also depending on some of their own specific characteristics. She was a feminist core in the state, and an ally of the Portuguese women's movement, an alliance that has evolved over the more than 30 years, during which it has leveraged women's issues and gender equality policies albeit with limited success, what I have appointed as a gap between the real and the possible.
Nestes quase quarenta anos de democracia, Portugal eliminou da legislação a discriminação em razão do sexo, assumiu o compromisso internacional com a agenda da igualdade e com as políticas de acção positiva e de "mainstreaming de género", e criou dois mecanismos oficiais permanentes para a igualdade de mulheres e homens. Temos o que tem sido considerado como uma boa legislação que parece demonstrar a vontade e acção do Estado português na promoção da igualdade entre os sexos. Porém, a constatação de inefectividades múltiplas na implementação das políticas foi uma das inquietações na origem deste trabalho, que cruza os campos da sociologia do Estado e da ciência política, da sociologia dos movimentos sociais e das relações sociais de sexo. O Estado Português tem vindo a assumir políticas de promoção da igualdade de mulheres e homens desde 1970, concretamente com a criação do principal mecanismo oficial para a igualdade (CCF/CIDM), actualmente a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG). Esta Comissão corporiza, no nosso país, o que tem sido considerado como uma forma de feminismo institucional, fenómeno estudado internacionalmente pela abordagem do feminismo de Estado. Por isso, sobre ela incidiu a pesquisa aqui apresentada.
Como quadro de referência conceptual usei a abordagem do feminismo de Estado que traduz a ideia de que a determinada altura o Estado, anteriormente visto pela maioria dos movimentos feministas como um opositor e rival patriarcal, terá passado a ser ele mesmo um aliado das causas das mulheres, incluindo-as nas suas agendas políticas. Considera-se que os mecanismos oficiais para a igualdade têm sido aliados dos movimentos de mulheres na representação descritiva e substantiva das mulheres, variando os seus níveis de sucesso em função de factores essencialmente ligados ao ambiente sociopolítico e às características dos movimentos de mulheres.
Adoptei o conceito de feminismo de Estado por ele ser um conceito relacional que traduz a interinfluência estratégica entre movimentos de mulheres, mecanismos como a Comissão e restantes agentes estatais e políticos na produção de resultados políticos, nomeadamente de políticas de igualdade. A produção destas políticas é vista como um processo complexo, multidimensional não dependente apenas da acção dominante de um tipo de agente (Estado, partidos políticos ou movimentos sociais), ainda que em determinados contextos um ou outro possa prevalecer.
O objectivo central deste estudo dirigiu-se, portanto, ao questionamento do papel e da acção da Comissão, como articuladora e agente pivô entre os movimentos de mulheres e o Estado na promoção de reivindicações, políticas e legislação para a igualdade de mulheres e homens, traduzindo-se esta acção no conceito de feminismo de Estado. Neste estudo procuro demonstrar o papel do mecanismo oficial para a igualdade em função de factores propostos na literatura, como sejam os de estruturas de oportunidades políticas e as estruturas de mobilização.
A pesquisa empírica foi realizada com base num estudo de caso sobre a Comissão, que requereu uma abordagem qualitativa composta, em termos de fontes de investigação, pela realização de 53 entrevistas semi-estruturadas e pela análise de material de arquivo (actas e documentos diversos) de legislação, publicações e artigos de imprensa.
A análise permitiu identificar quatro tipos de categorias em termos de efectividade e resultados (insider, marginal, simbólico, ausente) do feminismo de Estado em torno de agendas ou áreas políticas específicas (capítulo 4); e ainda quatro fases na evolução do feminismo de Estado - emergente, potenciado, formal e desafiado (capítulo 5). Foi possível concluir que a Comissão foi ao longo dos anos, em Portugal, uma portadora decisiva das reivindicações feministas perante o Estado, com impactos diferenciados consoante factores e variáveis relativos essencialmente ao contexto sociopolítico de actuação, a características/estratégias dos movimentos de mulheres, mas também consoante características suas específicas que a capacitaram (ou não) a efectivar a sua missão de participação na produção de legislação e de políticas. Ela foi um núcleo feminista no Estado, foi uma aliada dos movimentos de mulheres portugueses, numa aliança que evoluiu ao longo dos mais de 30 anos analisados, e ao longo dos quais tem alavancado as questões das mulheres e das políticas de igualdade sexual em Portugal, ainda que com um sucesso bastante limitado e condicionado, no que designei de hiato entre o possível e o real.