Esta escola de verão internacional do Projeto ALICE – Espelhos Estranhos, Lições Imprevistas: Definindo para a Europa um novo modo de partilhar as experiências do Mundo será lecionada por Boaventura de Sousa Santos. A escola de verão é constituída por um conjunto de seminários conduzidos em português, inglês e espanhol, e tem por objetivo desenvolver novos paradigmas teóricos e políticos de transformação social, apresentando e discutindo o pensamento crítico de Boaventura de Sousa Santos, a partir de um estudo das suas propostas teóricas e políticas para a transformação social.
As Epistemologias do Sul, termo cunhado por Boaventura de Sousa Santos, procuram dar corpo aos saberes e experiências do Sul global, como metáfora da exclusão, do silenciamento e da destruição de povos e saberes. Subjaz a esta proposta uma diversidade de lugares de enunciação, cujos pressupostos metodológicos e reflexivos, em diálogo, opõem-se a propostas de cariz etnocêntrico.
Subjacente à proposta das Epistemologias do Sul, está a ideia de que no Norte global há um sentimento de exaustão intelectual e política que se traduz como incapacidade de enfrentar, de forma inovadora, os vários desafios que interpelam o mundo nas primeiras décadas do século XXI: social, ambiental, justiça inter-geracional, cultural, histórica e cognitiva. Em contraste, o Sul global, na sua imensa diversidade, apresenta-se hoje como um amplo campo de inovação económica, social, cultural e político, um espaço que se almeja de crescente demodiversidade, onde os diálogos entre saberes traduzem condições de pluriversalidade.
A partir das Epistemologias do Sul, este curso procura ir além (metodológica e teoricamente) do pensamento moderno eurocêntrico, a saber, o pensamento abissal. O pensamento abissal divide o mundo, a partir de uma linha imaginária, entre os que estão “do lado de cá da linha”, e aqueles que estão “do lado de lá da linha”. Como Boaventura de Sousa Santos sublinha, ‘o outro lado da linha’, o Sul Global, desaparece enquanto realidade, tornando-se inexistente. As Epistemologias do Sul, ao desafiarem a centralidade hegemónica do moderno projeto de matriz eurocêntrica, apostam numa proposta radical de pensamento que promove a mudança social, política e institucional, a partir de um diálogo Sul-Sul, cujas premissas epistémicas desafiam as latências colonias, capitalistas e patriarcais.
As principais premissas das Epistemologias do Sul são:
- que a compreensão do mundo excede largamente a compreensão europeia do mundo;
- que não faltam alternativas no mundo. O que é realmente falta é um pensamento alternativo de alternativas;
- que a diversidade epistémica do mundo é infinita e nenhuma teoria geral pode almejar compreendê-la e explicá-la;
- que a alternativa a uma teoria geral consiste na promoção de uma ecologia de saberes combinados com tradução intercultural.
As Epistemologias do Sul denunciam, por um lado, as intervenções epistemológicas que geraram a supressão dos saberes ao longo dos últimos séculos, fruto da imposição da norma epistemológica dominante; por outro lado valorizam os saberes que resistiram com êxito e as reflexões que estes têm produzido e investigam as condições de um diálogo horizontal entre conhecimentos. Esse diálogo entre saberes que Boaventura de Sousa Santos dá o nome de ecologias de saberes, está no centro dos objetivos deste curso.
Estes diálogos, e o ensinamento que contém, refletem as inovações que ocorrem em países e regiões do Sul global. Uma aposta exigente, com certeza, para que pressupõe disponibilidade para o reconhecimento mútuo, a compreensão intercultural, a convergência política e ideológica, o respeito pela identidade e celebração da diversidade, condições para um diálogo mais democrático entre o Sul global.
Ao por em contacto os estudantes com Boaventura de Sousa Santos (com o seu pensamento crítico e reflexivo) o curso constituir-se-á como um espaço privilegiado para discutir possibilidades de transformação social, política e institucional a partir do Sul global.