Seminário
O tráfico de escravos e o comércio do álcool: a gerebita nas relações entre Angola-colónia e o Reino de Kasanje
José C. Curto (Universidade de York - Toronto)
2 de junho de 2014, 17h00
Sala 1, CES-Coimbra
Resumo
O seminário explora uma das muitas vertentes do impacto das bebidas alcoólicas em Angola através do tráfico atlântico de escravos. Estamos particularmente interessados em investigar as imagens dos abastecedores africanos de escravos que os montantes volumosos de álcool importado em circulação criaram nas mentes dos compradores de fora e em saber como estas imagens influenciaram as relações entre as duas comunidades. Para este fim, vamos analisar a questão da gerebita nas relações entre Angola-colónia e o Reino de Kasanje. A gerebita, ou cachaça brasileira, produzida em larga escala por escravos africanos e seus descendentes, muitos dos quais com origem no actual território angolano, foi uma das mais importantes mercadorias importadas pela colónia de Angola para se adquirir mão-de-obra escrava destinada ao Brasil. Volumes consideráveis desta bebida alcoólica eram encaminhados para o Reino de Kasanje, o mais importante abastecedor de escravos da colónia de Angola entre os meados do século XVII o princípio do século XIX. Todavia, a troca da gerebita por escravos não deixou de criar muitos problemas na feira de Kasanje. Entre o final do século XVIII e o princípio do século XIX, os governadores de Angola pintam uma imagem dos Jagas, ou reis de Kasanje, como constantemente alcoolizados pela gerebita. Supostos alcoólicos, os Jagas são assim vistos como incapaz de gerir o comércio de escravos com eficiência, o que leva os governadores de Angola a procurarem abastecedores africanos de escravos mais morigerados. O Reino de Kasanje vê assim o seu papel na economia atlântica da África central ocidental bastante reduzido, do que resulta a lenta queda do estado durante os meados do século XIX.
Nota biográfica
José C. Curto doutorou-se em História africana pela Universidade da Califórnia em Los Angeles e é, actualmente, professor associado do Departamento de História da Universidade de York, em Toronto. É vice-diretor do Harriet Tubman Institute for Research on the Global Migrations of African Peoples, da mesma universidade. A sua área de especialidade é a escravatura em Angola, em particular do ponto de vista da demografia histórica, e o comércio de álcool e de escravos em Angola. Publicou, em francês, inglês, português e espanhol, mais de 30 artigos em revistas e colectâneas científicas, sendo organizador (com outros especialistas) de três livros, o último dos quais Africa and the Americas: Interconnections during the Slave Trade, publicado pela Africa World Press. É autor de Enslaving Spirits: The Portuguese‑Brazilian Alcohol Trade at Luanda and its Hinterland, c. 1550‑1830, publicado pela Brill Academic Publishers. Desde 2007, dirige, com Paul Lovejoy, a revista African Economic History. Em 2009-2010, foi presidente da Canadian Association of African Studies / Association canadiene des études africaines. Está atualmente a escrever uma monografia sobre Benguela, cidade portuária de grande importância no abastecimento de escravos para o mundo atlântico ocidental.
Atividade no âmbito do Programa de Doutoramento"Pós-Colonialismos e Cidadania Global" e dos Núcleos de Estudos sobre Democracia, Cidadania e Direito (DECIDe) e sobre Humanidades, Migrações e Estudos para a Paz (NHUMEP)